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ACÓNITO NA MEDICINA ORIENTAL

Esta seção é dirigida a todos aqueles que tenham curiosidade acerca de sistemas terapêuticos alternativos como é o caso da Medicina Tradicional Chinesa que recorre ao uso de plantas que muitas das vezes não têm qualquer utilidade na medicina convencinal, como é o caso do acónito. 

Nesta área poderá encontrar uma compilação de informação muito específica retirada de artigos de revisão. A informação será particularmente útil para a comunidade oriental que viva em Portugal ou outros PALOPs e que continue a utilizar as suas terapias tradicionais ou até mesmo para herbalistas. É também um ponto de partida útil para académicos que estejam a fazer pesquisa na área. Nessa situação aconselha-se sempre a leitura dos artigos indicados nas referências que têm uma informação muito mais detalhada. 

 

Utilizações do Acónito na Medicina Oriental

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Na Medicina Tradicional Chinesa as raízes de acónito são usadas após processamento que reduz o conteúdo de alcalóides até 90%, reduzindo dessa forma a toxicidade. A Farmacopeia Chinesa inclui apenas monografias para o Aconitum carmichaeli Debx. e para o Aconitum kusnezoffi, sendo que essas plantas só podem ser usadas após processamento. (ver tabela) (2)

Tabela 1: Espécies de Aconitum referidas na Farmacopeia Chinesa (1)

O Aconitum kusnezoffii cresce essencialmente no nordeste da China, Russia, Japão e Coreia. É morfologicamente muito similar ao Aconitum japonicum e tal como este é usado para aquecer o corpo e aliviar a dor. A monografia da Farmacopeia Chinesa refere-se não só as raízes como também às folhas sendo que estas últimas são usadas na medicina tibetana e mongol. (2)

 

O Aconitum carmichaeli ocorre na provincia de Sichuan no sudoeste da China. Dela derivam dois medicamentos diferentes, Fuzi e Zhichuanwu, sendo que o Fuzi é o mais extensamente usado e é um dos medicamentos mais importantes da Medicina Tradicional Chinesa. (2) No Japão, o fármaco derivado a partir das raízes processadas desta espécie em particular é conhecido como Bushi. O Aconitum napellus, mais comum na Europa, é morfologicamente similar ao A.carmichaeli. (3)

 

Para além destas espécies, há várias outras que são usadas na medicina Oriental, entre elas Aconitum coreanum, Aconitum bullatifolium Levl. var homotrichum, Aconitum japonica, Aconitum alboviolaceum, Aconitum paniculigerum var. wuligense, Aconitum brachypodun, Aconitum pendulum, Aconitum subrosulatum e Aconitum lycoctonum, entre outros. (3)

No total há cerca de 76 espécies de acónito usadas em países asiáticos, mas mais de 90% dos produtos à base de Aconitum são derivados das duas espécies referidas pela Farmacopeia Chinesa. (3)

 

O Aconitum spp. é um dos “Quatro Pilares” da medicina tradicional chinesa daí haver mais de 600 formulações à base desta planta. (2) Segundo a teoria da MTC o acónito é uma planta seca e quente daí servir para tratar afecções causadas pelo frio.

No geral, as diferentes espécies são usadas na medicina oriental como analgésicos e anti-reumáticos e menos frequentemente agentes cardiotónicos. Apenas são usados após processamento das raízes sendo que as raízes não processadas não são usadas internamente, apenas são usadas externamente como anestésicos. (3) Para ver utilizações mais pormenorizadas de cada espécie, consulte a Tabela 2. 

 

 

Tabela 2: Descrição das utilizações das diferentes espécies de Aconitum na medicina oriental

De acordo com um compêndio de herbologia chinesa, o Fuzi é recomendado para situações de emergência em que há depleção do “yang” do organismo. Essa condição é caracterizada por hiperventilação com suores frios, intolerância ao frio, extremidades frias, diarreia contendo pedaços de comida não digerida e uma pulsação fraca.

O Fuzi restora o yang e aumenta o fogo aquecendo todos os órgãos, pois promove a abertura dos canais e dos colaterais. Os órgãos mais susceptíveis a uma depleção do yang são os rins, o coração e o baço. É recomendado em combinação com várias outras plantas para condições tais como dores menstruais, dores musculares e das articulações com dificuldade em movimentação, infertilidade, impotência, edema das extremidades inferiores, choque e insuficiência cardíaca. Para estes dois últimos casos é dito que o Fuzi é usado como uma substância injectável na China. (5)

 

De acordo com a Medicina Tradicional Chinesa, o acónito é incompativel com algumas plantas. Essas incompatibilidades estao previstas na Farmacopeia Chinesa e caso o médico insista em prescrever as combinações tem que assumir responsabilidade legal sobre o bem-estar do paciente. É dito que as especies de Aconitum são incompativeis com Rhizoma Pinelliae (rizomas de Pinellia ternata e Pinella pedatisecta),  Fructus Trichosanthis (Tianhuafen), Bulbus Fritillariae (Beimu), Radix Ampelosis (Bailian) e Rhizoma Bletillae (Baiji). (2)

 

A dose normal é de 3 a 15 gramas, sendo que mesmo que o produto já tenha sido processado, o utilizador deve fazer uma decocção durante 30-60 minutos antes da toma. Há outros autores que propõem doses que vão até aos 100gramas e outros que propõe doses mais baixas. (5)

De acordo com os autores do mesmo compêndio, uma overdose com Fuzi pode ser tratada atraves da toma de Rou Gui (Cortex Cinnamomi – casca seca de Cinnamomum verum ou de Cinnamomum cassia), 4-6h após a toma de Fuzi.

Uma oversoe caracterizada por batimentos cardíacos irregulares pode ser tratada com 20g de uma decocção de Ku Shen Gen (Radix Sophorae Flavescentis – raiz de Sophora flavescens) e 10g de Gan Cao  (Radix Glycyrrhizae – raízes de espécies de Glycirrhiza spp.).

Uma overdose caracterizada por extremidades frias, pulsação fraca e falta de ar pode ser tratada com Ren Shen

(Radix Ginseng – raiz de Panax Ginseng), Gan Cao (Radix Glycyrrhizae), e Gan Jiang (Rhizoma Zingiberis – rizoma de Zingiber officinale). Outras ervas indicadas para tratar overdose de Fuzi em doses que dependem da condição do paciente são  Sheng Jiang (Rhizoma Zingiberis Recens), Lu Dou (Semen Phaseoli Radiati), Hei Dou (Semen Glycine Max), Huang Lian (Rhizoma Coptidis) e Huang Qi (Radix Astragali). (5)

 

De notar que estas indicações não têm qualquer comprovação científica pela medicina ocidental, sendo apenas prescrições da medicina tradicional chinesa. Qualquer intoxicação por Fuzi é um risco de vida sério pelo que deverá ser tratada por um profissional qualificado.

 

Processamento das Raizes (2), (3)

 

Existem cerca de 70 formas de processamento descritas para raizes das varias espécies de Aconitum. A Farmacopeia Chinesa descreve um método básico de processamento de Fuzi (nome geral que se dá a todas preparações derivadas da raiz de A.carmichaeli), no qual Shengfuzi é a forma não processada.

Esta é posteriormente fervida originando Nifuzi que pode sofrer diferentes tipos de tratamentos posteriores originando Yanfuzi, Heishunpian e Baifupian. Estas três formas são as mais usadas:

a)      Yanfuzi: Nifuzi é mergulhado numa solução de sal durante a noite. Posteriormente, o produto é seco e mergulhado novamente nos proximos dias. O processo de secagem é progressivamente aumentado nos dias seguintes até que ocorra cristalização dos cristais de cloreto de sodio na superficie das raízes.

b)      Heishupian: pode-se traduzir como “fatias negras”. Tal como Yafuzi, o Nifuzi é mergulhado numa solução de sal. Após ser fervido, é lavado com água e corta-se em fatias longitudinais que são novamente mergulhadas na soluçao de sal e lavadas com água. A Farmacopeia Chinesa indica que as fatias devem ser adquirir uma cor negra. No final, as fatias são cozidas até ficarem secas e o processo de secagem é concluido expondo-as ao sol. Isto leva a que as raizes fiquem com um aspeto oleoso e lustroso na sua superficie.

c)       Baifupian: neste caso obtém-se fatias brancas. O Nifuzi é fervido na solução de sal mineral mas ao contrario do que ocorre com o Heishupian, a casca é removida antes de se partirem as raizes em fatias. Posteriormente as fatias são fervidas e secas aos sol. Em aguns casos são secas com vapor de enxofre para obter uma cor amarelada caracteristica.

 

Em alguns casos, o Baifupian ou Heishupian podem ser assados em conjunto com gengibre e originam Paofupian.  Pode-se ainda submeter o Yafuzi a um processo de decocção em conjunto com as raizes de Glycyrrhiza spp. e feijões pretos originando Danfupian. Neste ultimo caso, os alcalóides das espécies de Aconitum reagem com alguns componentes das espécies de Glycycrrhiza o que leva á precipatação de ambos e à remoção de parte dos alcalóides,  diminuindo assim a toxicidade. Alguns estudos em ratos demonstram que esta mistura possui propriedades antioxidantes. Além disso esta combinação diminui bastante a toxicidade das espécies de acónito, sendo uma mistura relativamente segura nas formulações de MTC. 

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Figura 2: Raizes de acónito sujeitas ao mínimo processamento.  

Retirada de: https://www.pinterest.com/pin/290341507200432916/

Figura 1: Esquema do processamento de raízes de acónito sugerido pela Farmacopeia Chinesa. (2)

CONTROLO DE QUALIDADE DAS FORMULAÇÕES DE MTC (2), (3)

 

Tendo em conta a gravidade das intoxicações por Aconitum é importante o desenvolvimento de métodos analíticos quantitativos e qualitativos para a determinação de alcalóides, de forma a ser possível fazer o controlo de qualidade das diferentes formulações tradicionais chinesas vendidas.

 

Um dos métodos mais preciso para quantificação de alcalóides do acónito é o método de HPLC-DAD (HPLC com detecção por photodiade array). De facto o HPLC é largamente usado para avaliar a composição de produtos da MTC. Para além deste método incluem-se outros métodos tais como LC-DAD (cromatografia liquida com detecção por photodiade array), LC-MS (cromatografia liquida associada a espectrometria de massa). A deteção com espectrometria de massa tem permitido o estudo qualitativo da amostra com elucidação da estrutura de vários compostos. A ressonância magnéctica nuclear (NMR) pode também ser útil na descoberta de vários compostos, não sendo necessário a preparação de curvas de calibração.

 

Recentemente técnicas que acoplam a cromatografia liquida a uma espectrometria de massa, NMR ou detecção por ultravioleta têm sido os métodos preferidos para analisar a composição de produtos de MTC. Estes métodos permitem analisar compostos desconhecidos em amostras complexas através da possibilidade de comparar os espectros obtidos com os gravados em bibliotecas online. Isso é importante não só no controlo de qualidade dos produtos como também na detecção de metabolitos dos alcalóides em amostras biológicas de vítimas de intoxicação.  

 

O método de GC-MS (cromatografia gasosa com espectrometria de massa) é o único que permite detectar níveis vestigiais de alcalóides no sangue e urina.

 

É necessário ter em conta o processo de extração dos alcalóides. Estes são instáveis em alguns solventes, decompondo-se rapidamente em soluções alcalinas e a altas temperaturas. São mais estáveis em solventes orgânicos apróticos tais como o acetonitrilo (MeCN) e tretahidrofurano (THF) e diclorometano. Um método de extracção que tem dado resultados eficazes é a SPE (solid phase exctration).

 

Seria importante estabelecer um método padrão para efetuar controlo de qualidade aos produtos preparados à base de acónito. Caso as análises de composição fossem feitas rotineiramente, isso iria permitir utilizar as formulações tradicionais com maior segurança e qualidade. 

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REFERÊNCIAS

 

1. Chan TY. Aconite poisoning. Clin Toxicol (Phila). 2009;47(4):279-85.

 

2.  Singhuber J, Zhu M, Prinz S, Kopp B. Aconitum in traditional Chinese medicine: a valuable drug or an unpredictable risk? J Ethnopharmacol. 2009;126(1):18-30.

 

3. Nyirimigabo E, Xu Y, Li Y, Wang Y, Agyemang K, Zhang Y. A review on phytochemistry, pharmacology and toxicology studies of Aconitum. J Pharm Pharmacol. 2015;67(1):1-19.

 

4. Gajalakshmi S, Jeyanthi P, Vijayalakshmi S, Devi Rajeswari V. Phytochemical Constituent of Aconitum species - A review. International Journal of Applied Biology and Pharmaceutical Technology. 2011; 2(4): 121-7

 

5. Chen J, Chen T. Chinese Medical Herbology and Pharmacology - Chapter 7 . Art of Medicine Press. 2000.

Disponível em: http://www.aompress.com/book_herbology/pdfs/FuZi.pdf

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